A expressiva valorização do dólar frente ao real e a escassez de matéria prima fez com que o IGP-M e o INCC, índices atrelados à correção monetária dos financiamentos imobiliários, tivessem altas históricas deslocando-se da realidade inflacionária nacional.
Quem tem um financiamento imobiliário provavelmente levou um susto nos últimos meses: as parcelas devem ter apresentado uma grande correção. Isso ocorreu em razão do crescimento do INCC (Índice Nacional de Custos de Construção), e do IGP-M (índice que reflete a evolução dos preços de atividades produtivas da indústria nas transações comerciais).
Diante desse crescimento das parcelas e da insegurança em arcar com financiamento, comprometendo o sonho da casa própria, o brasileiro procura soluções para estabelecer o reequilíbrio contratual e analisar se está pagando juros abusivos.
Para compreender as possibilidades de redução de custos do financiamento, é preciso entender algumas questões:
1º) se o contrato está atrelado a um sistema de correção monetária com juros simples ou capitalizados;
2º) qual o sistema de amortização de juros
3º) se o contrato foi celebrado com uma instituição do sistema financeiro nacional ou não.
1. Juros Simples ou Capitalizados:
Os juros correspondem ao preço do dinheiro, eles remuneram quem concedeu o crédito. Ou seja, quando o banco te empresta um determinado valor para que você realize a compra do imóvel, os juros representam exatamente o lucro e a remuneração do banco por essa operação.
A forma de contagem da taxa de juros pode ser realizada de maneira simples ou capitalizada.
Os juros contados de forma simples não se acumulam com o principal para contagem de novos juros, enquanto que os juros contados de forma capitalizada ou composta se acumulam com o principal para contagem de novos juros, cuja prática é denominada de anatocismo.
A forma capitalizada de contagem de juros é extremamente danosa ao devedor. Tomemos como exemplo o indivíduo que que tenha utilizado o limite de R$ 10.000,00 no cheque especial e tenha permanecido pelo período de 18 meses. No final do contrato o valor pago será de R$ 76.899,66, ou seja, mais de 7 vezes o valor original da dívida.
Portanto, o primeiro passo é verificar se o contrato está atrelado a um sistema de juros simples ou compostos, e para fazer essa análise é necessário analisar o sistema de amortização de juros adotado no financiamento.
2. Sistemas de amortização de juros:
O sistema de amortização representa a modalidade em que os juros e a dívida principal são pagos, ou seja, da parcela mensal que você paga qual o percentual vai para o pagamento da dívida principal e qual valor é destinado ao pagamento dos juros.
Abordaremos agora os modelos adotados com mais frequência no Brasil.
a) Tabela Price:
Também denominado de sistema francês de amortização, usa o regime de juros compostos para calcular o valor das parcelas de um empréstimo e, dessa parcela, qual é a proporção relativa ao pagamento de juros e a amortização do valor emprestado.
b) Sistema de amortização constante:
Nesse sistema, as amortizações do saldo devedor são constantes, mas as prestações iniciais são mais altas, uma parcela fixa da prestação vai abatendo o que você deve e, sobre o saldo cada vez menor, são aplicados os juros.
3. Contratos com instituições financeiras e não financeiras
Até aqui entendemos que os sistemas de juros compostos são extremamente gravosos para os devedores e que a Tabela Price é um sistema de amortização que utiliza o modelo que prejudica o consumidor.
Agora precisamos entender com qual instituição o contrato de financiamento foi celebrado, pois é esse fator que determinará a possibilidade de aplicação ou não dos juros compostos.
a) Financiamento com instituições financeiras (Banco)
A medida provisória n° 2170-36 regularizou a prática de cobrança de juros capitalizados pelas instituições financeiras. Conforme o seu art. 5°:
“Art. 5º Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”
Em razão disso foram celebradas as seguintes teses:
- É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após a medida provisória n° 2170-36, desde que expressamente pactuado.
- A capitalização de juros em periodicidade inferior a um ano deve vir pactuada de forma expressa e clara. Portanto, a mera menção numérica das taxas não basta para caracterizar a pactuação expressa de juros capitalizados.
Logo, podemos concluir que a legislação brasileira permite que os bancos adotem o sistema de juros capitalizados, ou seja, o sistema de juros sobre juros, desde que estejam expressamente pactuados no contrato.
Sendo assim, verifica-se que nesses contratos não é possível afastar a incidência dos juros compostos, restando a possibilidade de analisar se a taxa de juros aplicada se encontra em excesso.
Sobre essa questão, o STJ entendeu que a revisão da taxa de juros remuneratórios somente é admitida em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada.
Nesse contexto, o Banco Central passou a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras.
Assim, dentro do universo regulatório atual podemos considerar que a taxa média divulgada pelo Banco Central é o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.
A jurisprudência tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da média divulgada pelo BACEN.
b) Situação jurídica dos contratos celebrados diretamente com a construtora
O financiamento direto realizado por construtoras, sem a participação direta de uma instituição financeira, é vedada a utilização de capitalização de juros.
Ou seja, nesse tipo de contrato é possível solicitar a troca da capitalização por juros simples e a adequação a média de juros divulgada pelo BACEN.
Advogado, na área empresarial, com foco no setor imobiliário, graduado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas, com especialização em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Direito Imobiliário pelo EBRADI/SP e Mestrando em economia e mercado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atualmente exerce a função de Assessor Parlamentar, para assuntos tributários, na Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas.