2021 foi um ano marcado pelo suspiro dos problemas de 2020, pelos novos desafios que surgiram e pela esperança do combate a uma pandemia que assolou a vida de diversas pessoas.
Fazer uma retrospectiva significa basicamente olhar para trás e relembrar os eventos que ocorreram. Nem sempre é fácil, seja pela imensidão de eventos, seja pela dificuldade de selecionar os mais dignos de análise, seja, ainda, pelas sensações que o passado pode suscitar.
Mais difícil que fazer uma retrospectiva é fazer uma prospectiva. Ou seja, um conjunto de análises a respeito de fenômenos que podem acontecer no futuro da sociedade.
Prever e construir o futuro é um desejo coletivo primitivo. Na história, foram representados por meio de astrologia, mitologia, religiões e várias outras expressões. Hoje já podemos falar na futurologia, como uma ciência social que busca estudar e analisar possibilidades de futuro.
Mas todas essas sistematizações enfrentam o desafio da incerteza do porvir. Não há como ter domínio sobre todos os acontecimentos futuros. Em 2018, se alguém falasse que aconteceria uma pandemia mundial, talvez muita gente nem acreditasse. Mas o fato é que o ser humano não deixa de fazer conjecturas e isso também é importante para nos posicionar em face dos possíveis acontecimentos, bem como compreender os rumos da nossa história.
Falando em tecnologia, a prospectiva é ainda mais difícil em razão do ritmo acelerado e dinâmico. É possível que quando você esteja lendo esse texto, outras tecnologias já estejam sendo desenvolvidas e tornem obsoletas todas as apostas que estão sendo feitas agora. Mas ainda assim vale a pena comentar.
Em 2021 tivemos a vigência das sanções administrativas da Lei Geral de Proteção de Dados. A segurança cibernética, então, assume relevância e passa a ser um ponto importante para qualquer negócio, caracterizando uma tendência tecnológica para 2022. Aprimorar os padrões de privacidade e proteção de dados passa a ser um requisito não somente de conformidade legal, mas também de responsabilidade social e relevância de marca.
O armazenamento em nuvem assume destaque como uma maneira de proteger os dados de uma corporação, prevenindo contra eventuais imprevistos que ponham em xeque a integridade das informações e proporcionando a possibilidade de recuperação de arquivos (backup).
Essa tendência também se fortalece com a dependência cada vez mais frequente que os negócios possuem em relação às redes sociais e ao uso de dados.
Em 2021 tivemos a maior pane das redes sociais, ocasião em que WhatsApp, Facebook e Instagram ficaram fora do ar por mais de seis horas em aproximadamente 45 países, para a tristeza e preocupação de muitos (e alegria de alguns).
Para além disso, continuamos convivendo com a ocorrência de ciberataques, tais como o suportado pelo Ministério da Saúde, que tirou do ar a página da pasta e sistemas como o ConecteSUS e o Portal COVID.
Para 2022, as big techs oferecem algumas promessas tecnológicas: veículos autônomos continuam a ser desenvolvidos e o Facebook – que agora se chama Meta – avança no desenvolvimento de um Metaverso, um universo paralelo de realidade virtual. Em alguns anos, a proposta é que seu ambiente de trabalho possa acontecer em um mundo virtual.
É difícil dizer se 2022 será o ano de regulação das big techs, mas o fato é que em 2021 tramitam vários projetos de lei no Congresso Nacional destinados a criar um marco regulatório para fake news e inteligência artificial. O PL 21/2020, inclusive, que versa sobre princípios e fundamentos para a inteligência artificial, já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e segue para análise do Senado Federal.
No entanto, ainda há expressiva influência das próprias big techs no processo legislativo, favorecendo a criação de marcos regulatórios que lhe são favoráveis, em detrimento dos interesses dos setores mais vulneráveis da sociedade, o que caracteriza um fator de preocupação para o ano de 2022.
Outra promessa para o próximo ano é a quinta geração da internet: o 5G. A promessa é de facilitar a experiência digital e a comunicação com mecanismos de inteligência artificial. Esse cenário favorece o crescimento de setores como a Internet das Coisas (IoT, do inglês Internet of Things) – compreendido como o desenvolvimento de uma rede de objetos com conexão digital entre si – chatbots, comandos de voz e plataformas de realidade aumentada.
A inteligência artificial segue aquecida, focada na automação de processos e no atendimento ao usuário. A modelagem de linguagem visa permitir que a comunicação entre seres humanos e máquinas seja cada vez mais satisfatória.
Em termos empresariais, isso implica redução de custos e facilidade nos processos corporativos internos. Por outro lado, para o consumidor, a hiperautomação pode ser um fator de estresse e dificuldade na resolução de questões com o fornecedor. Com o desenvolvimento do e-commerce, ou seja, a demanda de compras pela internet, as solicitações de suporte e atendimento passam a ser cada vez mais operacionalizadas por chatbots inteligentes (alguns não tão inteligentes assim). A automação robótica é uma tendência para os próximos anos, argumentando-se que contribui para o atendimento ao consumidor em razão da otimização do tempo.
No entanto, não raro, o que se verifica na prática são chatbots que nem sempre conseguem resolver a demanda do cliente, além do absurdo tempo de espera que o consumidor se submete na mera tentativa de falar com um atendente humano, seja pela internet ou pelo telefone.
Em busca de maior agilidade, os assistentes de voz passam a ser cada vez mais usados (alô, Alexa!). A ideia é que, com o tempo, os clientes se habituem a realizar compras sem precisar digitar ou abrir uma tela, fazendo-o simplesmente por comando de voz.
Ainda no ramo corporativo, as empresas distribuídas passam a refletir o padrão de trabalho remoto ou híbrido, instalado de forma massiva na pandemia. Assim, os colaboradores podem trabalhar em qualquer lugar. No entanto, é necessário pensar em padrões corporativos saudáveis que estabeleçam limites entre a interação do ramo doméstico e laboral, evitando que o empregado se submeta a jornadas de trabalhos intermináveis ou se desestabilize na própria rotina.
O âmbito financeiro continua a dialogar com a ideia do investimento em criptomoedas e o ramo bancário considera utilizá-las, estimando-se que esse setor obterá US$ 1 bilhão em valor comercial a partir do uso de criptomoedas baseadas na blockchain.
Em síntese, os últimos anos têm demonstrado como a tecnologia pode ser uma aliada na otimização de processos e na resolução de problemas ao passo em que também pode ser uma ameaça a alguns fundamentos e pilares sociais.
O fato é que a transformação digital é um caminho sem volta que não pede licença e, após a pandemia, a tendência é que muitos dos hábitos virtuais permaneçam nos acompanhando por muito tempo.
Com 2022 se aproximando, compreender a inovação e os impactos dos recursos tecnológicos disruptivos é elemento essencial para a sobrevivência de organizações e para a manutenção de valor competitivo.
Sugestão de filme: Black Mirror: Bandersnatch (2018). Direção: David Slade.
Gabriela Buarque é advogada e mestranda em Direito pela Universidade Federal de Alagoas. Pesquisadora no Projeto Privacy Lab do Centro de Direito, Internet e Sociedade (CEDIS) do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e na equipe de inteligência artificial do Laboratório de Políticas Públicas e Internet (LAPIN).