Artista alagoano tem obras selecionadas para exposição no Carrossel do Louvre

(Arte: Jhonyson Nobre)

Jhonyson Nobre terá duas obras expostas no espaço subterrâneo do museu, em abril.

A internet, definitivamente, pode abrir diversas portas na vida das pessoas. Foi o que aconteceu com o artista alagoano Jhonyson Nobre, natural de União dos Palmares, na Zona da Mata.

Com obras digitais híbridas e feitas à mão no portfólio, Jhonyson foi selecionado para enviar dois dos seus trabalhos para serem expostos no Carrousel du Louvre, em abril de 2022. O espaço é uma área subterrânea, que faz parte do Museu do Louvre, localizado em Paris.

As duas obras são inéditas e fazem parte de uma série chamada “Linhas, marcas e outras vivências”, que tem como objetivo evidenciar as marcas que carregamos na pele. O artista explica que sempre utiliza quatro pilares para produzir: a memória, a ancestralidade, o autoconhecimento e o afeto.

“Meu trabalho é muito autobiográfico. A série começou com um autorretrato meu, a partir de uma reflexão que eu tive quando eu estava produzindo. A professora do curso de poética me pediu para fazer um autorretrato porque eu tinha uma questão muito grande com perfeccionismo. Fiz o primeiro autorretrato e não ficou parecido comigo, porque eu mudava as coisas que eu não gostava em mim, e aí eu criei uma pessoa que não era eu. Aí eu fiz o segundo, mesmo achando que não ia ficar bom, com a ideia de valorizar as minhas marcas, as imperfeições do meu rosto, porque a construção de tudo isso faz ser quem eu sou”, expõe.

(Arte: Jhonyson Nobre)
Obra “O vermelho é apagamento, mas enraizar é resistência”, por Jhonyson Nobre.

O alagoano utiliza técnicas variadas, como pintura a óleo e tinta acrílica, mas após desenvolver uma alergia ao material, recorreu ao digital para não parar de produzir, utilizando mesa digitalizadora e tablet.

Jhonyson conta que busca fotos de amigos e familiares para criar as telas, acrescentando as linhas na pele com o intuito de valorizar a imagem e a beleza deles, com todas as características e imperfeições, além de construir uma narrativa por trás.

Na técnica híbrida ou mista, Jhonyson constrói o retrato do personagem digitalmente e desenha as linhas na pele, deixando o espaço para a pintura de alguns elementos com a tinta após a impressão da obra.

“Eu conecto a minha memória com a questão do afeto pelos meus amigos e parentes e ressignifico algumas figuras que, de certa forma, são apagadas, mas que são parecidas comigo. São pessoas negras que tiveram uma história de resistência, luta, e um objetivo para trazer. Essas memórias apagadas eu tento trazer para o meu trabalho como uma forma de valorizar minha ancestralidade, meus traços, minha família, as pessoas que vieram antes de mim e construíram o caminho para que hoje eu pudesse, por exemplo, chegar num lugar como o Louvre”, salienta o artista.

Uma das obras que serão expostas no Carrousel du Louvre retrata a imagem da irmã do artista, e é uma reflexão sobre como nos prendemos às questões do futuro, do que ainda vai acontecer, e com isso esquecemos de viver o agora.

(Arte: Jhonyson Nobre)
A obra “Eu Vejo a Dimensão”, será uma das que serão expostas no Carrossel do Louvre.

As duas obras que estarão em Paris foram produzidas de maneira digital, no tablet e, depois, impressas em tecido. As telas também apresentam símbolos que aparecem com certa frequência no trabalho de Jhonyson, como a lua, na obra “Eu Vejo a Dimensão”. O mesmo elemento também pode ser visto na outra obra que vai para a exposição, “Vendedor de Dimensões”, nos olhos dos peixes.

(Arte: Jhonyson Nobre)
“Vendedor de Dimensões”, será a outra obra de Jhonyson a ser exposta no Carrousel du Louvre

Além da simbologia, o alagoano diz que estuda muito a área e tenta ter uma outra visão da arte, valorizando e se inspirando em artistas negros e latinos que retratam e dão visibilidade às minorias em suas obras.

Jhonyson também utiliza bastante a cor azul nas peças, e conta que isso se apresenta em sua vida de um jeito natural, por gostar da cor e por sempre ter tido uma conexão grande com o mar.

“A questão do azul para artistas negros é muito recorrente. Sabe num filme quando a pessoa está pensando no passado e o filme fica meio sépia? O azul entra nesse sentido, como se fosse um acessório da memória, a memória personificada”, explica.

Trajetória

Jhonyson faz faculdade de Direito e também trabalha na área, mas desde 2019 resolveu investir mais na arte.

Durante a pandemia, o artista aproveitou o tempo livre que tinha em casa para produzir esculturas, pinturas à óleo e tinta acrílica, além das artes digitais. Para o alagoano, a arte o salvou durante o isolamento social.

A oportunidade para expor duas de suas telas, ele conta que veio sem planejamento, ao conhecer uma artista que também já expôs trabalhos no Carrousel du Louvre. O colega explicou como funcionava o processo, e posteriormente, Jhonyson foi descoberto por uma assessoria através da internet, que o selecionou para enviar as obras.

Ao receber a notícia de que foi selecionado, conta que não soube como reagir por sempre ter pensado que isso não era possível de acontecer. O artista diz que a oportunidade lhe trouxe uma sensação de orgulho e vontade de continuar atuando no meio artístico.

“Isso foi um pontapé muito grande para minha carreira enquanto artista, porque isso aconteceu no início da carreira. Como artista emergente, construindo uma poética, uma narrativa, uma forma de linguagem, isso vai me trazer uma grande visibilidade. Vai ser um repertório muito massa para o meu currículo ter essa exposição”, salienta.

Esta será a primeira vez que Jhonyson viaja para fora do Brasil. Para o artista, a oportunidade foi a realização de um sonho, além de mostrar a outros artistas que é possível chegar a um dos museus mais famosos do mundo.

“Eu sempre tive o sonho de conhecer o Louvre, e agora o meu trabalho vai estar lá, e eu quero que ele toque as pessoas. Eu vejo isso como uma conquista minha, com muito esforço, claro, mas também como uma forma de dizer que é possível você, jovem artista, chegar nesse lugar. Eu sei que não é fácil, mas siga firme, porque o que é feito com verdade impacta”, salienta.

O artista conta que algumas de suas referências e admirações são Van Gogh, Henri Matisse, Egon Schiele, Frida Kahlo, Abdias do Nascimento, Carolina Maria de Jesus, Kerry James Marshall, Zéh Palito, Kika Carvalho e Ariano Suassuna.

Além dos grandes nomes, outras questões também têm influência nas produções do alagoano, como o Direito, área em que Jhonyson atua, ao abordar a vulnerabilidade social e usar a arte como uma plataforma para críticas.

Desafios

Com a ida ao Louvre e as despesas que terá durante a viagem, Jhonyson diz ter tentado conseguir patrocínio através do Instagram, onde divulga seu trabalho. Apesar da tentativa, não conseguiu o apoio, mas acrescenta que não vai perder a chance de ir a Paris mesmo com a ausência de incentivos.

“Eu sou uma pessoa que acha que é muito bom crescer, mas crescer junto é muito melhor, então se eu puder trazer os meus amigos junto comigo, as pessoas que eu admiro junto comigo, eu vou fazer”, diz o artista. 

Algumas obras de Jhonyson Nobre podem ser vistas no Instagram.


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