Conheça Marivana Oliveira, paratleta alagoana que conquistou prata em Tóquio

(Foto: Ale Cabral/CPB)

Atleta compete desde os 18 anos e conquistou primeira medalha olímpica no Rio, em 2016.

Se não fosse a insistência de colegas enquanto ia para a reabilitação, talvez Marivana Oliveira da Nóbrega, de 31 anos, não tivesse essa mesma história para contar.

A alagoana, nascida e criada em Maceió, é medalhista paralímpica do atletismo. Cravando 9,15m, Marivana conquistou, na última quarta-feira (1), em Tóquio, mais uma medalha para a coleção: prata no arremesso de peso categoria F35, para paralisados cerebrais.

Apaixonada por esporte desde criança, Marivana gostava de acompanhar as olimpíadas quando era mais nova. Na escola, ficava apenas sentada vendo as colegas jogarem vôlei, porque não era inserida em nenhuma modalidade, até então. Foi essa situação que fez a alagoana acreditar, por muito tempo, que não existia esporte para pessoas com deficiência (PcD). 

Atualmente, ela é uma das favoritas da modalidade, registrando marcas altas na categoria e um desempenho crescente na carreira esportiva. Em 2016, conquistou medalha de bronze nas paralimpíadas do Rio, e já se vê competindo em Paris, em 2024.

O início da trajetória

Marivana veio ao mundo com apenas 6 meses de gestação, e ao nascer foi diagnosticada com paralisia cerebral, condição que afetou seus membros inferiores. Após passar por três cirurgias, começou a andar aos 7 anos de idade. 

A alagoana frequentava a Associação de Deficientes Físicos de Alagoas (Adefal) para fazer reabilitação, quando ouviu pela primeira vez, aos 15 anos, que tinha o perfil para o atletismo. Por ser nova, Marivana não deu muita atenção na época. 

“O Antônio, que trabalhou com a paratleta Sônia Gouveia, me viu fazendo hidroterapia e falou que eu tinha o perfil para atletismo, só que eu tinha 15 anos na época e eu não dava muita bola pra ele, não queria aquilo pra mim. Na minha cabeça, não tinha esporte para pessoas com deficiência. Eu ainda vivia presa, vivia num casulo. Comecei a melhorar depois que conheci a Adefal e fui evoluindo, porque lá tem bastante gente com deficiência também, então eu meio que saí do casulo”, explica a paratleta. 

(Foto: Ale Cabral/CPB)
Marivana foi a única representante de Alagoas nas Paralimpíadas de Tóquio 2020. (Foto: Ale Cabral/CPB)

Depois de muita insistência dos colegas, Marivana resolveu tentar a modalidade quando já tinha 17 anos. Ao vê-la arremessar o peso e lançar o disco, a treinadora sabia que havia potencial na alagoana. 

Com o apoio da família, Marivana começou a competir em 2008, com 18 anos, mas ainda não tinha ideia do que estava por vir, já que, na época, seu objetivo era apenas viajar para estados das regiões Norte e Nordeste do país.

Desafios na carreira esportiva

Apesar de ter a assistência inicial na Adefal, a paratleta explica que não tinha em Maceió a estrutura necessária para treinar e praticar a modalidade, e que mesmo com muitas promessas feitas em relação a sua carreira, não conseguiu o apoio que precisava no estado. 

“No começo, quando ninguém sabe do seu potencial, é uma aposta, né? Não é todo mundo que aposta numa incógnita. Eu não gosto de falar muito disso, mas às vezes a gente tem que falar para ver se melhora para os outros atletas que estão começando. Me prometeram muita coisa e não cumpriram nada, foi complicado”, revela a alagoana. 

Mesmo após ser medalhista, Marivana diz que teve dificuldade para conseguir apoio do estado em que nasceu. A atleta paraolímpica conta ter ficado feliz com as homenagens após a conquista mais recente, mas vê como um reconhecimento tardio do governo.

“Eu tive que representar outros estados, porque no meu estado mesmo ninguém nunca me deu a mão. Eu fico triste, porque eu tive que mostrar o meu valor em outros lugares para o pessoal me valorizar, e não é nem questão de ficar famosa, eu não quero ser famosa, eu quero ter o mérito do que eu faço, do que eu represento. Sou uma atleta. Ninguém em Maceió me conhece. Se você perguntar quem é Marivana Oliveira, atleta de Alagoas, ninguém vai saber. Sou de Alagoas, com muito orgulho, muito prazer, sou feliz demais por ser alagoana, mas fico triste por não ter tido apoio”, conta.

(Foto: Ale Cabral/CPB)
Paratleta conquistou prata com arremesso de 9,15m, na categoria F35. (Foto: Ale Cabral/CPB)

Marivana ainda alerta para as necessidades dos atletas, e observa que existem muitos esportistas bons e com potencial em Maceió.

“Eu represento o Nordeste, mas eu sinto que falta algo de Alagoas. Se a gente tivesse estrutura e as pessoas certas nos setores certos, eu acho que melhoraria muito. A gente quer que eles façam algo, façam pista, setor. Maceió tem muita gente boa, muito atleta bom, precisa de incentivo. Não é incentivo só com dinheiro, é lugar pra treinar, é um transporte de qualidade, respeito ao atleta, dignidade, a gente precisa disso”, salienta a paratleta.

Marivana precisou mudar de estado para seguir seu sonho

Em 2011, Marivana teve a oportunidade de se mudar para o Rio de Janeiro, onde conseguiu patrocínio e um local especializado para os treinamentos. Foi lá que a paratleta se preparou para a primeira ida às paralimpíadas, que aconteceram em Londres, no ano de 2012.

Mesmo com o suporte da equipe, não foi na ocasião que a alagoana conquistou um medalha, ficando em 6º lugar no arremesso de disco, e em 7º lugar no arremesso de peso da categoria. 

O desânimo bateu no ano de 2013, quando perdeu o patrocínio que tinha no Rio de Janeiro. Marivana pensou em voltar para Maceió e desistir da carreira, quando, segundo ela, “mais um anjo entrou em sua vida para ajudar”. 

“Eu sempre tive sorte e pessoas maravilhosas na minha vida, que sempre me incentivaram. Tinha uma funcionária lá do patrocinador, que eu tenho ela como uma mãe, me ajudou muito muito, e eu sou eternamente grata a ela. Eu falei que teria que voltar para Maceió porque o custo de vida no Rio era alto, e ela disse: ‘no que depender de mim, você não vai desistir do seu sonho, você vai à luta, você vai morar na Cidade de Deus comigo, mas você vai continuar treinando e vai ganhar essa medalha no Rio’”, lembra Marivana. 

E assim a alagoana fez. Anos depois, nas Paralimpíadas do Rio, em 2016, subiu no pódio e conquistou sua primeira medalha paralímpica: bronze no arremesso de peso F35. 

Em 2018, Marivana se mudou para São Paulo, onde mora até hoje, e precisou se reinventar mais uma vez, por chegar em um local diferente do que era acostumada. 

Apesar da distância e da saudade dos familiares, a paratleta agarrou a oportunidade de melhorar seu desempenho e correr atrás do seu sonho. “O Comitê Paralímpico me abraçou, me ajudou, me levou pra São Paulo, estou com uma estrutura muito boa, e o resultado tá aí”, completa. 

Vivendo do esporte

Atualmente, a paratleta recebe a Bolsa Pódio, categoria mais alta do Bolsa Atleta, que patrocina aqueles que têm potencial de disputar finais olímpicas e ganhar medalhas, além de ser patrocinada pelo time São Paulo.

Até conseguir o apoio que tem hoje, a alagoana enfrentou alguns momentos difíceis. Quando perdeu o patrocínio no Rio, Marivana recebia apenas R$ 500 de auxílio, enquanto o patrocinador bancava as outras despesas. Com a bolsa que ganhava, a atleta paraolímpica mal conseguia alugar uma kitnet para morar.

Longe de casa, a paratleta não desistiu tão rápido do sonho. “Foi muito difícil, mas eu corri atrás. Eu não sou de desistir fácil, eu sou movida a desafios”, salienta. Apesar das dificuldades, a alagoana diz não ter trabalhado em outra área, dedicando todo o seu tempo ao atletismo.

(Foto: Ale Cabral/CPB)
Paratleta cobra mais apoio e estrutura para atletas alagoanos. (Foto: Ale Cabral/CPB)

Aos jovens e atletas no início da carreira, Marivana aconselha a não desistirem dos sonhos, além de nunca deixar que outra pessoa coloque barreiras no caminho.

“Nunca pense que você não pode. Tudo você pode e tudo depende de você. Não deixe ninguém limitar o seu sonho, e se você tiver um sonho, agarra ele como se não houvesse amanhã e luta. A gente pode sonhar e tem que correr atrás, porque cair do céu não vai. Se não correr atrás, não conquista nada e não tem sonho certo. Não deixa ninguém dizer que você não é capaz, você é capaz de tudo, só basta você crer, ter vontade, foco, força, determinação, e muita fé. E o resto, Deus trabalha”, conclui a alagoana.

Tóquio 2020

Feliz e honrada pela conquista. É assim que Marivana descreve a experiência de ter conquistado a medalha de prata em Tóquio. A alagoana explica que a intenção era brigar pelo bronze, mas com a falta de uma adversária, viu a oportunidade de subir mais um degrau no pódio.

“Eu não tenho vergonha nenhuma de falar que eu vim pra cá para brigar pelo bronze. Isso não é demérito, isso é honra, eu sou honrada e sou grata a Deus por isso. Eu estou trabalhando para chegar no nível das minhas adversárias, mas não é fácil. Como uma adversária, recordista paraolímpica, não veio, eu sabia que tinha uma possibilidade enorme de ganhar a prata, porque a única pessoa que fazia acima de 9,50m ali era eu. Só que a minha competição ali era contra mim mesma”, conta a alagoana.

Marivana diz que, apesar de ser sua terceira participação em paralimpíadas, estava muito nervosa e com receio de não conseguir uma medalha. Nesta edição, ela foi a única participante do estado de Alagoas.

“Eu to feliz, honrada pela prata, feliz demais por ela, e vamos para frente! Vou continuar trabalhando, pézinho no chão, humildade sempre, e é isso. Fiz o meu melhor, e o meu melhor foi a prata”, comemora.

Participação em competições

Marivana participou, ao todo, de três paralimpíadas: Londres 2012, Rio 2016, e Tóquio 2020.

O seu currículo também conta com participação em três Jogos Parapan-Americanos. Em Guadalajara 2011, conquistou uma medalha de prata e uma de ouro no arremesso. Em Toronto 2015, Marivana também levou uma medalha de ouro para casa, e no Peru, em 2019, conquistou o bronze.

No Mundial Paralímpico de Atletismo, a alagoana marcou presença em Lyon (França), em 2013, onde ficou em 7º e 5º lugar nos arremessos de disco e peso, respectivamente. Em 2015, Marivana conquistou uma medalha de bronze no arremesso de peso em Doha (Catar), resultado que se repetiu em 2019, na edição que ocorreu em Dubai (Emirados Árabes Unidos).

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