Para quem não leu a coluna anterior, sugiro a leitura prévia neste link aqui para entender o conteúdo de hoje. Para quem já acompanhou a primeira parte desta série, sem maiores delongas, vamos seguir na análise das 10 regras básicas sugeridas por Virginia Shea, em 1994, e conhecidas como Netiquette.
4. Respeite o tempo e o autocontrole das outras pessoas
A probabilidade de um desavisado ler essa regra e achar que ela foi escrita hoje, pensando especialmente no contexto dos apps de mensagens instantâneas (WhatsApp, Telegram e afins), é enorme.
Mas, na verdade, essa lógica já era prevista desde a época da criação e ascensão da Internet, num aparente exercício de futurologia dos criadores e idealizadores da rede. E então qual é o âmago dessa regra? Ela traz consigo uma lógica aparentemente óbvia, mas que precisa ser constantemente rememorada: nem todo mundo estará disponível para você, ainda que esteja online, no exato momento do envio da mensagem!
Lembre-se: um aplicativo de mensagem instantânea é instantâneo e simultâneo para todos os remetentes, mas o destinatário é único.
Portanto, respeite o tempo de resposta da outra pessoa e, se for urgente, a ligação continua sendo o caminho mais rápido de contato com a outra ponta. O envio de mensagens e e-mails pressupõe que a pessoa que recebe poderá ler e responder no seu próprio tempo e não no tempo almejado por quem enviou.
5. Faça-se parecer bem online
Tenha o mesmo cuidado com a sua persona virtual que você tem no mundo físico. Seja educado, cordial e tenha em mente que a mensagem virtual, na grande maioria das vezes, não carrega a mesma entonação que ela teria num diálogo comum.
Quem aí nunca achou que letras maiúsculas remetiam a um tom de voz mais elevado e ríspido quando recebeu uma mensagem desse jeito ou quantas vezes um emoji não fez toda a diferença na interpretação de um determinado conteúdo?
É importante observar a forma para dar a conotação desejada e, sempre que possível, utilizar-se de recursos online para trazer uma maior pessoalidade a esta interlocução digital.
6. Compartilhe conhecimento científico
A Internet surgiu e cresceu diante de um contexto de compartilhamento de conhecimento científico. O projeto da rede, antes mesmo de sonhar em chegar ao que é hoje e de ter o alcance comercial que tem, tinha como princípio basilar a troca de informações científicas entre diversas universidades, primeiro nos EUA, e depois ao redor do mundo.
Tem-se, assim, a eclosão e crescimento de uma grande criação cultural, lastreada, sobretudo, na base aberta do compartilhamento para democratização do conhecimento e fomento da inovação.
Várias iniciativas não-governamentais sustentam até hoje a ideia do compartilhamento gratuito de conhecimento, tal como a Creative Commons, seguindo esse anseio dos criadores da rede.
Além disso, várias gigantes digitais – dentre elas o próprio Google – trabalham com o regime do código aberto, como forma de permitir a colaboração dos usuários para criação de sistemas mais seguros, rápidos, customizados e estáveis.
Sem qualquer perspectiva de exaurir o tema, ante a sua inegável profundidade, existem várias discussões interessantes que tangenciam essa ideologia primária da Internet, tais como proteção de direitos autorais e de propriedade intelectual.
7. Ajude a manter as flame wars sob controle
Flame wars é um termo em inglês cujo significado não é alcançado pela tradução literal para a língua portuguesa. Em linhas gerais, o termo se refere a uma discussão acalorada entre os usuários da Internet que, repetidamente, lançam provocações de parte a parte com ataques pessoais por e-mail ou outras formas.
As pessoas envolvidas em flame wars seriam, por exemplo, o que hoje se chama de haters, no ambiente das redes sociais. O que a Netiquette propõe é que esse tipo de conteúdo não seja – seguindo a lógica atual – compartilhado, para evitar, assim, a sua viralização na rede.
8. Respeite a privacidade dos outros
Essa regra não poderia ser mais atual (e relevante)! No contexto de constantes discussões sobre privacidade no mundo, de General Data Protection Regulation (GDPR) na Europa, de Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil e de várias outras iniciativas difusas, não custa lembrar que, desde antes de 1994, já se falava na importância do respeito à privacidade.
Trata-se de direito fundamental previsto na Constituição Federal (art. 5º, X) e pedra fundamental para exercício da cidadania e para manutenção do Estado Democrático de Direito.
9. Não abuse do seu poder
Nos tempos de narcisismo ideológico, de bolhas de conhecimento, de câmaras de eco, de polarizações e extremismos, dentre tantos outros comportamentos sociais nocivos, é fundamental relembrar essa regra tão básica.
A construção de uma relação de confiança – base de toda relação humana – não comporta comportamentos abusivos, principalmente de pessoas em posições de liderança. Mais poder, mais responsabilidades, sempre.
10. Seja tolerante com os erros das outras pessoas
A última regra, porém não menos importante, parece mandar um recado direto para a turma da “cultura do cancelamento”, prática a que assistimos de forma tão corriqueira não apenas no ambiente virtual, mas também no mundo físico (para ilustrar, basta lembrar da polêmica do BBB 21 envolvendo a cantora Karol Conká).
De novo, em plena era de extremismos, torna-se cada vez mais urgente o desenvolvimento de habilidades de empatia e tolerância para potencializar diversidade e inclusão.
Ao fim e ao cabo, o que sempre me pego pensando é: se a grande maioria dos usuários seguisse essas regras de comportamento online, sem dúvidas teríamos um ambiente digital mais equilibrado e mais ético com claros reflexos sociais
É importante sempre lembrar que a construção de uma sociedade mais inclusiva, justa e democrática começa com o comportamento individual de cada cidadão e que a força do coletivo tem um poder revolucionário.
E para finalizar, que tal um quiz básico sobre as regras de comportamento online? Quiz On Netiquette: Trivia Questions! Para quem quiser compartilhar o resultado e discutir o tema, me conta o que achou do conteúdo e do teste!
Nathália Grizzi é sócia titular da Área Empresarial de Martorelli Advogados, com especial foco em estruturação de novos negócios, operações de M&A e de investimentos, projetos de reorganização societária, planejamentos patrimonial e sucessório, reestruturação de capitais e negociação de contratos nacionais e internacionais. Entusiasta de novas tecnologias e da importância dos novos negócios na modulação e construção da sociedade, Nathália acredita na potência da interconexão, da diversidade e do compartilhamento de experiências e conhecimento para a construção de uma sociedade mais inclusiva.